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Propriedades mecânicas da lâmina de uma faca

Na construção das suas facas artesanais deve prestar atenção especial à escolha do tipo de aço usado na lâmina, que junto com a geometria e o design da aresta, é um dos elementos que determinam o bom desempenho de uma faca.

Alguns dos aspetos mais importantes no aço para cutelaria incluem dureza, tenacidade, resistência ao desgaste, resistência à corrosão e retenção de fio.

  • A dureza é a capacidade de resistir à deformação quando sujeita a tensões e forças aplicadas. A dureza em aços para facas está diretamente relacionada com a resistência e usualmente é medida usando a escala Rockwell C (também conhecida como “HRC”).
  • A tenacidade é a capacidade do aço para resistir a fraturas geralmente causadas pelo impacto ou “cargas repentinas”e é importante para evitar que a lâmina se quebre ou lasque. Existem várias maneiras de medir a tenacidade, portanto, ela é menos padronizada que a dureza quando se trata de facas, mas em geral, quanto mais duro o aço, menos resistente ele será pelo que a dureza e a tenacidade de uma faca são inversamente proporcionais.
  • A resistência ao desgaste é a capacidade que o aço tem de resistir a danos causados tanto por desgaste abrasivo quanto por desgaste adesivo. O desgaste geralmente está relacionado com a dureza, mas também é fortemente influenciado pela química específica do aço. Um aço com uma resistência ao desgaste é normalmente capaz de manter o fio afiado por mais tempo.
  • A resistência à corrosão é a capacidade de resistir à oxidação do aço causada por elementos externos, como humidade e salinidade, gerando a ferrugem. A resistência à corrosão, está geralmente relacionada com a quantidade de carbono presente na composição do aço sendo que quanto mais carbono tiver, menos resistente à corrosão será.
  • A retenção de fio representa o tempo que uma lâmina mantém a sua nitidez, quando sujeita a períodos de uso. Infelizmente, medir a retenção do fio de uma lâmina é algo muito subjetivo, pois é uma combinação de resistência ao desgaste e uma aresta que resiste à deformação.

Propriedades Químicas e Físicas do Aço

Existem diferentes tipos de aço usados na cutelaria. As propriedades químicas e físicas do aço que influenciam a dureza, tenacidade, resistência ao desgaste, resistência à corrosão e retenção de fio incluem a composição química do aço, o tratamento térmico e o processo de fabrico.

  • A composição química do aço é importante porque afeta as propriedades do aço. Por exemplo, o carbono é um elemento importante no fabrico de facas porque aumenta a dureza do aço. Outros elementos de liga como cromo ou vanádio também podem ser adicionados para melhorar as propriedades do aço.
  • O tratamento térmico é outro fator importante que afeta as propriedades do aço. O tratamento térmico envolve aquecer o aço a uma temperatura específica e depois resfriá-lo rapidamente. Isso pode ajudar a melhorar as propriedades do aço, como dureza e tenacidade.
  • O processo de fabrico também é importante porque pode afetar as propriedades do aço. Por exemplo, o processo de forjamento pode ajudar a melhorar as propriedades do aço porque ajuda a eliminar impurezas e melhora a estrutura cristalina do metal quando comparado com o processo de desbaste.

Composição Química

Cada tipo de aço tem na constituição da sua liga uma composição química diferente, onde cada elemento é fundamental para fornecer a melhor base para um bom aço para facas de acordo com a funcionalidade pretendia, tornando-o mais previsível e fácil de usar. Não existe, porém, um aço perfeito em todas as suas características na medida em que a adição de elementos químicos tem sempre um impacto positivo em algumas características, mas também um impacto negativo noutras. Ou seja, a escolha do melhor aço para facas não é simplesmente uma questão de maximizar cada uma das propriedades acima, trata-se de uma espécie de troca, onde é necessário escolher as características mais importantes para a faca que vai construir, em detrimento de outras.

Assim, deve sempre ser usado um aço de acordo com a com a funcionalidade que se pretende para a faca a ser construída pois o material que torna o aço forte (alto teor de carbono / carbonetos) possivelmente diminuirá a tenacidade.

Por exemplo, numa faca de chef, as propriedades que devem ser valorizadas são a dureza, a resistência ao desgaste e a retenção de fio. A dureza é importante para manter o fio da faca por mais tempo. A resistência ao desgaste é importante para evitar que a faca perca o fio rapidamente. A retenção de fio é importante para manter o fio da faca afiado por mais tempo. A tenacidade e a resistência à corrosão também são importantes, mas não tão importantes quanto as propriedades mencionadas anteriormente para esta função. Por outro lado, se o pretendido é uma faca de caça ou de sobrevivência, as propriedades que devem ser valorizadas são a tenacidade e resistência à corrosão. A tenacidade é importante para evitar que a lâmina quebre ou lasque durante o uso. A resistência à corrosão é importante para evitar que a lâmina enferruje ou oxide. A dureza e retenção de fio também são importantes, mas não tão importantes como as mencionadas anteriormente para esta função.

A composição química de um aço para facas deve ser equilibrada, sem excesso de liga e precisa. Por isso, é essencial conhecer as especificações do aço para cutelaria, de forma a garantir uma alta qualidade na faca acabada.

O aço é uma liga metálica composta por aproximadamente 98,5% de ferro (Fe) e entre 0,5 e 1,7% de carbono (C). Tem ainda traços de outros elementos químicos tais como Alumínio (Al), Boro (B), Cromo (Cr), Cobalto (Co), Cobre (Cu), Chumbo (Pb), Enxofre (S), Fósforo (P), Manganês (Mn), Molibdênio (Mo), Nitrogênio (N), Nióbio (Nb), Níquel (Ni), Enxofre (S), Selênio (Se), Silício (Si), Tântalo (Ta), Titânio (Ti), Tungstênio (W), Vanádio (V), Zircônio (Zr)

A quantidade de cada elemento químico presente na composição do aço para facas artesanais afeta as suas características físicas e mecânicas.

  • Alumínio (Al) – pode ser adicionado como desoxidante, formando com o oxigênio inclusões em partículas diminutas, com menor efeito nocivo para o aço, dificultando a oxidação. Em pequenas quantidades também controla o crescimento do tamanho do grão pois evita que o aço tenha grãos grossos.
  • Boro (B) – melhora a temperabilidade, diminui a taxa de nucleação da ferrita e bainita e é um importante elemento inibidor da formação de ferrita, evitando efetivamente trincas longitudinais na superfície do aço. Além disso, o boro pode ser adicionado como desoxidante formando com o oxigênio inclusões em partículas diminutas. Aumenta ainda a dureza e resistência ao desgaste. É mais eficaz em aços de baixo carbono.
  • Carbono (C) – Presente em todos os aços para facas, o carbono é o elemento mais importante de endurecimento do aço, reduzindo o desgaste que o material poderá sofrer com o tempo, mas a medida em que é adicionado, pode reduzir a tenacidade do aço e aumentar seu potencial de oxidação. Os teores de carbono presentes em aços são classificados em baixo carbono (0,3% ou menos), o meio (0,4% e 0,7%) e alto (0,8% ou mais).
  • Cromo (Cr) – é o elemento que atua no combate à corrosão do aço sendo um dos elementos principais na composição de facas de aço inoxidável. As facas de aço inoxidável têm o cromo como ingrediente principal, normalmente no mínimo 12%. O cromo também aumentará a força de uma faca, no entanto, a adição de cromo em grandes quantidades diminui a resistência.
  • Cobalto (Co) – tem alta solubilidade em ferro alfa e gama mas uma fraca tendência a formar carbeto. Ele reduz a temperabilidade mas mantém a dureza durante o revenimento. Ele é usado como ligante em metais duros intensificando a influência de elementos mais importantes em aços especiais e permitindo maiores temperaturas durante o procedimento de tratamento térmico.
  • Cobre (Cu) – é adicionado em aços estruturais resultando na excelente combinação de tenacidade e resistência mecânica e maquinabilidade. Além disso, o cobre produz o efeito de pátina que aumenta consideravelmente a resistência à corrosão. Porém, o uso do cobre como elemento de liga é muito limitado, por causa do sério problema de fragilidade a quente no fabrico do aço, que provoca trincas no lingotamento contínuo, laminação a quente e forjamento
  • Chumbo (Pb) – é usado em pequenas quantidades para melhorar a usinabilidade do aço. No entanto, o chumbo é um elemento tóxico e pode ser prejudicial à saúde humana e ao meio ambiente.
  • Enxofre (S) – normalmente não é desejável em aços para cutelaria, o enxofre aumenta a usinabilidade, mas diminui a tenacidade.
  • Fósforo (P) – presente em pequenas quantidades na maioria dos aços, o fósforo é essencialmente um contaminante, que reduz a tenacidade das lâminas. Em quantidades muito pequenas, melhora a resistência à corrosão e oxidação, a usinabilidade e a dureza.
  • Manganês (Mn) – melhora a estrutura do grão e contribui para a temperabilidade e resistência ao desgaste. Presente na maioria dos aços para cutelaria, em grandes quantidades, aumenta a dureza e ajuda a melhorar a resposta do material ao tratamento térmico, reduzindo a distorção das peças e melhorando sua resistência à corrosão.
  • Molibdênio (Mo) – é um elemento de liga que evita a fragilidade do aço e mantém a resistência do aço em altas temperaturas, também melhora a usinabilidade e resistência à corrosão.
  • Nitrogênio (N) – atua de forma muito semelhante ao carbono na liga, atuando como substituto do carbono no aço inoxidável. Quando se adiciona nitrogênio aos aços inoxidáveis, consegue-se aumentar, simultaneamente, a resistência mecânica, a resistência ao desgaste e à corrosão.
  • Nióbio (Nb) – é um forte formador de carboneto e melhora a ductilidade, dureza, resistência ao desgaste e à corrosão. Além disso, refina a estrutura do grão.
  • Níquel (Ni) – é utilizado para aumentar a dureza do aço, sua resistência ao impacto e ductilidade. É também um material de grande resistência mecânica à corrosão e à oxidação. Outra razão pela qual o Ni é adicionado a uma liga é que ele cria porções mais brilhantes nos aços damasco.
  • Enxofre (S) – aumenta a usinabilidade do aço e melhora sua capacidade de corte
  • Selênio (Se) – Normalmente não é desejável em aço para cutelaria, mas assim como o enxofre, em pequenas quantidades pode ser adicionado para melhorar a usinabilidade.
  • Silício (Si) – É caracterizado por aumentar a resistência em aços pobres e produz forte dureza, resistência mecânica (ao desgaste) e aos ácidos. Além disso, remove o oxigênio aquando da formação do metal aumentando assim a resistência à corrosão e à oxidação do aço.
  • Tântalo (Ta) – Quimicamente, é muito semelhante ao Nióbio (Nb) e como tal, tem efeito semelhante na liga, contribuindo para melhorar a ductilidade, dureza, resistência ao desgaste e à corrosão.
  • Titânio (Ti) – Usado para controlar o crescimento do tamanho do grão, o que melhora a tenacidade. Também transforma as inclusões de sulfeto de forma alongada em globular, melhorando a tenacidade e a ductilidade.
  • Tungstênio (W) – aumenta o limite de resistência à tração, à abrasão (resistência ao desgaste) e a dureza a quente dos aços, no entanto, reduz sua condutividade térmica. Esse elemento é muito encontrado em aços rápidos e é um formador de carbonetos que melhora a retenção do corte das lâminas.
  • Vanádio (V) – em pequenas concentrações aumenta a dureza a quente e diminui o tamanho do grão do aço. Também ajuda a melhorar a retenção do fio, a resistência ao desgaste e o limite de escoamento em aços rápidos.
  • Zircônio (Zr) – Normalmente é adicionado a aços de baixa liga e baixo carbono para melhorar as características de inclusões do aço, ou seja, transforma a forma de alongada em globular, melhorando a tenacidade e a ductilidade.

Tratamento Térmico

O tratamento térmico é outro fator importante que afeta as propriedades do aço e que busca elevar a dureza do aço. Este processo consiste no aquecimento da lâmina numa forja até a temperatura não magnética (acima da zona crítica) seguido de uma têmpera e posterior revenido.

Existem diferentes tipos de tratamentos térmicos aplicáveis ao aço, cada um com sua especialidade e objetivo. A composição química do aço também afeta o tipo de tratamento térmico a ser efetuado.

A temperatura é capaz de influenciar na taxa de transformação da austenita em perlita e, influenciar na microestrutura e na distância interlamelar final da liga de aço e, por conseguinte, nas propriedades mecânicas. A microestrutura e o espaçamento interlamelar da perlita dependerá da temperatura, da taxa e do teor de carbono do aço.

A têmpera é um processo de arrefecimento rápido num meio refrigerativo como óleo para tempera após o tratamento térmico de uma peça. A têmpera, produzindo martensita leva à obtenção de resistência mecânica/dureza bem mais alta do que a obtida por normalização (microestrutura ferrítico-perlítica fina), mas as tensões associadas à transformação martensítica podem causar trincas e distorções no aço temperado e assim, logo após a têmpera o aço deve ser revenido.

O revenimento é um processo que envolve o tratamento térmico para aumentar a tenacidade das ligas à base de ferro. É feito a uma temperatura diferente para cada tipo de aço, onde após certo tempo, o forno é desligado e a peça é arrefecida no seu interior de forma controlada com um abaixamento da temperatura também de acordo com cada tipo de aço. Embora durante o revenido, a resistência mecânica/dureza caia um pouco, mas não muito, devido à difusão dos átomos de carbono para fora da martensita, assim um pouco empobrecida, as tensões são eliminadas, resultando em considerável ganho de tenacidade, além de evitar trincas e distorções.

Processo de Fabrico

O processo de fabrico também é importante porque pode afetar as propriedades do aço.

Existem dois processos de fabrico que os cuteleiros usam para a construção das suas facas:

  • Processo de forjamento
  • Processo de desbaste

O processo de forjamento é um processo de fabrico definido como o trabalho num metal para transformá-lo na forma desejada usando forças de compressão localizadas. Os golpes são feitos com um martelo (muitas vezes, um martelo de potência). Assim, é um processo de fabrico que envolve a moldagem de um metal por meio de martelagem, prensagem ou laminação. O processo de forjamento pode ajudar a melhorar as propriedades do aço porque ajuda a eliminar impurezas e melhora a estrutura cristalina do metal quando comparado com o processo de desbaste. O resultado é um metal mais denso e resistente.

O processo de desbaste é um processo de remoção de material em excesso para dar forma à peça. É um processo que envolve o uso de ferramentas abrasivas para remover material da superfície da peça. O desbaste pode ser feito manualmente ou com o uso de máquinas. O resultado é uma superfície mais lisa e uniforme.

Ambos os processos têm suas vantagens e desvantagens. O processo de forjamento é geralmente considerado superior ao processo de desbaste para o fabrico de lâminas devido à sua capacidade de produzir uma lâmina mais densa e resistente. No entanto, o processo de forjamento é mais caro e demorado do que o processo de desbaste.

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